12 de mar. de 2017

GRILOS E GAFANHOTOS - GRILAGEM E PODER




Nesta semana teremos outro evento de lançamento do livro GRILOS E GAFANHOTOS  - GRILAGEM E PODER.
Aquisições autografadas podem ser feitas pelo email rrd.adv@hotmail.com.

CURADORIA ESPECIAL - MÚNUS PÚBLICO DA DEFENSORIA PÚBLICA - ISENÇÃO DE CUSTAS - INOCORRÊNCIA DE DESERÇÃO - STJ ARESP 385.378

                                                                     A Curadoria Especial é munus público cometido por lei à                                                                       Defensoria Pública. Inocorrência de hipótese de pagamento                                                                     de custas. Isenção reconhecida para a Curadoria Especial,                                                                       como parte, na forma da lei. 


STJ - ARESP 385.378-RJ.

      Em agosto de 2016 fomos intimados de decisão em que o Ministro Relator não conhecia do Agravo em Recurso Especial interposto pela Curadoria Especial, em prol de interesses de terceiro, na forma das normas de regência. Constava na decisão, in verbis:

                                                             ..."Mediante análise dos autos, vê-se que o apelo nobre não foi                                                              instruído com a guia de custas e o respectivo comprovante de pagamento. "

        Uma vez intimados da decisão, em 16.9.2016 interpusemos Agravo Interno no STJ, cujos fundamentos foram acolhidos pelo eminente Ministro Relator Gurgel de Farias, que então proferiu a seguinte decisão, publicada em 08.2.2017, in verbis:

         "AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 385.378 - RJ (2013/0274680-7) RELATOR : MINISTRO GURGEL DE FARIA AGRAVANTE : GALDINO CHRISTINO SILVA ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO AGRAVADO : PETRÓLEO BRASILEIRO S A PETROBRAS ADVOGADO : VITOR SERRANO PORTO D'AVE E OUTRO(S) - RJ145390 DECISÃO Trata-se de agravo interno interposto por GALDINO CHRISTINO SILVA, por meio da Defensoria Pública, contra decisão por mim exarada às e-STJ fls. 339, que conheceu do agravo para não conhecer do recurso especial, por deserção. Nas suas razões (e-STJ fl. 347), a defensoria pública aduz que "o recurso não tem mesmo preparo, pois a parte recorrente e atuante no processo em defesa do Sr. Galdino Christino Silva é a CURADORIA ESPECIAL, como consta nos autos, por exemplo, às fls. e-STJ 147 e reconhecido pelo E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, às fls. e-STJ 208 (Acórdão)". Decurso do prazo para impugnação in albis (e-STJ fl. 353). Passo a decidir. Razão assiste ao agravante, visto que a deserção, na hipótese vertente, não deve ser analisada sob o estrito enfoque da gratuidade da Justiça, mas sim levando em conta o livre exercício do munus público atribuído à Defensoria Pública, o qual também deve ser garantido em grau de recurso. Com efeito, não é possível exigir do réu ausente, e muito menos da Defensoria Pública, que o representa na condição de curadora especial, o pagamento das custas processuais referentes ao preparo. Essa exigência, em verdade, encerra negativa de prestação jurisdicional, pois representa armadilha procedimental que impede o exercício da garantia constitucional da ampla defesa pela Defensoria Pública na instância recursal. No mesmo sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CURADOR ESPECIAL. RÉU REVEL. AUSÊNCIA DE PREPARO. DESERÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. "Em caso de nomeação de Curador Especial, o preparo do recurso somente pode ser relevado se o nomeado for a Defensoria Publica ou se deferido o benefício da gratuidade de justiça ao réu revel." (EDcl no AREsp 49.499/ES) 2. Agravo regimental desprovido (AgRg no REsp 1537810/SC, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/11/2015, DJe 16/11/2015). PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PREPARO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. CURADOR ESPECIAL. 1. É dispensável o preparo do recurso somente quando a parte for representada pela Defensoria Publica ou se deferido o benefício da gratuidade de justiça ao réu revel. Precedentes do STJ. 2. Hipótese em que o Curador Especial, inscrito na OAB, não é membro da Defensoria Pública, bem como não foi provada a concessão da Justiça Gratuita. 3. Agravo Regimental não provido (AgRg no REsp 1345670/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/11/2012, DJe 18/12/2012). Ante o exposto, RECONSIDERO a decisão de e-STJ fl. 339, tornando-a sem efeito. Após, voltem-me os autos conclusos para nova apreciação do agravo em recurso especial. Publique-se. Intimem-se. Brasília (DF), 1º de fevereiro de 2017. MINISTRO GURGEL DE FARIA Relator" (fonte: https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=MON&sequencial=68426221&num_registro=201302746807&data=20170208&tipo=0&formato=PDF)

         A acertada e justa decisão acima é fundamental precedente para o tema, vez que tão bem e corretamente analisou a hipótese, inclusive destacando que não tem cabimento exigir-se do réu ausente (e citado por edital ou com hora certa) que comprovasse seus rendimentos... A hipótese não é de comprovação de gratuidade da parte, mas de isenção absoluta para a CURADORIA ESPECIAL, função legalmente cometida ao Defensor Público. 

CITATIO EST FUNDAMENTUM TOTIUS JUDICE:

         Para que alguém seja parte num processo é fundamental que integre validamente a lide. Para tanto, deverá ter sido validamente citado, na forma do brocardo latino citatio est fundamentum totius judice.

Para casos em que não tenha ocorrido a citação “pessoal” do Réu o legislador criou a figura do CURADOR ESPECIAL, que não é advogado ou defensor da parte, mas substituto processual legitimado extraordinariamente, para atuar em nome próprio, não como representante da parte.

A Curadoria Especial é múnus institucional cometido à Defensoria Pública.

Diz o novo CPC:

                      “Art. 72. O juiz nomeará curador especial ao:
... Parágrafo único. A curatela especial será exercida pela Defensoria Pública, nos termos da lei.”

 Nacionalmente a Defensoria Pública é regida pela LEI COMPLEMENTAR FEDERAL 80/94, com as modificações introduzidas pela LEI COMPLEMENTAR 132/2009, que assim dispõe:

                                Lei Complementar Federal 80/94:
Artigo 4º: São Funções instituicionais da Defensoria Pública, dentre outras:”
...XVI – exercer a curadoria especial nos casos previstos em lei;    (Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009).


Discorrendo sobre a Defensoria Pública e sua categorização constitucional, o eminente Ministro Ricardo Lewandowski[1] assim se pronunciou, in verbis

... "há uma diferença muito interessante entre o que diz o artigo 134 e o 133 da Carta Magna. O artigo 134 diz: "A Defensoria Pública é" - ou constitui - "instituição essencial à função jurisdicional" (...) Portanto, integra-se ao aparato da prestação jurisdicional, sendo quase um órgão do Poder Judiciário. Não avanço tanto, mas integra, sem dúvida, esse aparato. E o artigo 133, quando fala do advogado, não usa essa expressão, mas diz: "O advogado é indispensável à administração da justiça" (...) Embora ele faça parte do tripé, no qual se assenta a prestação jurisdiconal, ele se aparta um pouco desta categoria especial, desse status especial, que se dá à Defensoria Pública. Por essas razões, acompanho integralmente o eminente Relator, julgando improcedente a ação" (grifos e destaques nossos).

        
LIEBMAN dizia que “sem a citação não existe processo” (válido)!

Por seu turno, o antigo CPC, em seu art. 9o, inciso II, que será dado curador especial ao réu preso, ao passo que o art. 282, do CPC, em seus incisos II e IV falam da indicação do réu e do requerimento para sua citação.  E por qual motivo? Porque a citação é o ato pelo qual se chama a juízo o réu (CPC, art. 213) ou, noutras palavras, é “a comunicação que se faz ao sujeito passivo da relação processual (réu ou  interessado) de que em face dele foi ajuizada demanda”... (nota 2, ao art. 213 - (NELSON NERY JUNIOR - em seu festejado CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL COMENTADO, ed. RT, 10Aa. edição).

              O NOVO CPC segue a mesma intenção:

 “Art. 72. O juiz nomeará curador especial ao:
...Parágrafo único. A curatela especial será exercida pela Defensoria Pública, nos termos da lei.”

O vício da citação macula o processo e por isso a legislação processual fixa que não será feita na pessoa do curador especial.

Este apenas atua quando não se tem a citação válida do Réu no processo, em casos em que ocorra revelia do que tenha sido citado fictamente (por edital ou hora certa) ou esteja preso.

         Sobre a nulidade da atuação do curador especial em não tendo havido citação do réu, em jurisprudência do E. STJ (fonte, site do STJ), temos decisão unânime da 2a. Turma, sob a relatoria do eminente Ministro Mauro Campbell Marques, proferida no julgamento do Resp 639.984-MG (j. 11.11.2008), onde consta, in verbis:

...”PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. NOMEAÇÃO DE CURADOR ESPECIAL.
INVALIDADE. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO.
1. Consoante Súmula 196/STJ e art. 9º , II, do CPC, é cabível a
nomeação de curador especial ao devedor citado por edital ou por hora certa.
2. Hipótese dos autos em que sequer houve a citação, o que torna inválida a nomeação do curador para representar os interesses da empresa executada.
3. Recurso especial provido.”(n.g.)
  
CURADORIA ESPECIAL NA DOUTRINA

Convém considerar importantes ensinamentos, contidos no livro O CURADOR ESPECIAL NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, 2a. ed., página 5, editora FORENSE, 2002, da lavra da Defensora Pública LÍGIA MARIA BERNARDI, in verbis:

...”A natureza jurídica do curador especial é a de ser legitimado extraordinariamente para atuar em proteção e ou em defesa daqueles a quem é chamado a representar, e não como substituto processual, como adiante se verá”...

         CONCLUSÃO

       A acertada decisão em comento bem aplicou as normas de regência e compreendeu a "armadilha procedimental" ao se exigir comprovação de rendimentos do réu ausente e citado por edital ou com hora certa e, por isso, representado em Juízo pelo CURADOR ESPECIAL. O exercício da Curadoria Especial pelo Defensor Público é munus público e isento de pagamento de custas.

Rogério Devisate,
Defensor Público (RJ) de Classe Especial, junto ao STF e STJ




[1]  Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.643/STF: voto proferido em 8 de novembro de 2006 no julgamento da ADI 3643/STF — julgada improcedente e que era contra a criação do fundo especial da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro — quando pronunciou-se sobre diferença entre a intenção do constituinte quando fala do papel do defensor e do advogado, diferenciando-os nos respectivos dispositivos constitucionais. O voto em comento pode ser consultado na íntegra no próprio site do STF, constando no mesmo, às fls. 163/164, o trecho que aqui destacamos.